Quando
se parte sente-se o coração dividido. Por um lado, por aquilo e por aqueles que
deixamos, é a nossa realidade e os nossos amigos e familiares que ficam, e isso
tem o seu peso. Por outro lado, vai-se já com uma vontade enorme de estar lá, de
sentir, amar, rezar com as pessoas que esperam por nós. E é esta 'divisão
interior' do que fica, mas também do que se vai encontrar, que se transporta nos
corações...
Ao
pisar solo brasileiro, mais propriamente Chapadinha, é como que sentir que uma
primeira etapa da missão foi cumprida, fez-se a viagem.
E
quando cheguei aquela cidade do nordeste brasileiro (do estado do Maranhão)
(re)encontrei muitas coisas. Um clima inclemente que não poupa e faz sofrer
mesmo os mais habituados a altas temperaturas, uma cidade barulhenta que ficou
ainda mais agudizada pelo facto de ser ano de eleições, mais poluição fruto do
aumento de veículos que se estacionam nas bermas da estrada (mais “motocas” e
mais carros)… Mas tudo isto faz parte do circunstancialismo espácio-temporal
que apesar de influenciar o meu sentir e modo de estar não representa
certamente o mais importante e fundamental da minha experiência missionária.
Quando falo e penso Chapadinha
logo me vêm à memória muitos rostos, crianças, jovens e velhos. Sorrisos e
lágrimas partilhados, testemunhos escutados e lições que guardo para o meu
viver. Um povo que transporta em si uma fé vibrante e impulsionadora, capaz
mesmo de “mover montanhas.” Tudo para eles é dom e motivo de partilha. Toca-me
quando do pouco eles conseguem mudar a lógica racional europeia que nos faria
acreditar que pouco dariam, mas não… do pouco se faz muito pela generosidade da
partilha. Povo generoso por natureza, acolhe com tudo aquilo que pode dar, ama
com um amor inexcedível quem dele se aproxima para o escutar. Povo sofrido e
muito, porque com um passado de sofrimento dos sem-terra e com um presente de
sofrimento com a corrupção política, a fome, a prostituição, a violação, a
droga, a violência doméstica. Dramas que, no fundo, são universais a todo o
viver humano mas que nesta realidade parecem ganhar proporções mais elevadas.
A missa é para eles o momento de
abandono a Deus-Amor, é lugar para fazer festa e para esquecer os problemas
da vida, é lugar para orar rezando, cantando e dançando, pois é o Senhor quem
nos convida.
O interior é uma realidade
distinta da realidade da cidade. Aí sente-se ainda mais a ingenuidade saudável
deste povo, que fez Jesus dizer um dia que o Reino dos Céus é das crianças. No
interior até o céu é diferente, brilha de forma diferente, as estrelas
precipitam-se a brilhar com outra intensidade e vigor, um céu mágico sem
dúvida. É também no interior que se pode dar conta da realidade que os padres
missionários da Boa Nova vieram um dia encontrar, ainda há comunidades a
viverem aí segundo o mesmo estilo de há 30 anos atrás. E tanto que têm feito
por este povo…
Chapadinha é também a vida
comunitária que nós partilhamos enquanto grupo, enquanto família ao longo
daquele mês de Agosto. É vivermos como irmãos, onde o confronto nos ajuda a
crescer entre risos e lágrimas.
2012
foi a possibilidade de ir a Chapadinha pela terceira vez. A oportunidade de
viver mais uma vez junto daquele povo. Cada ano é um ano, cada ano é diferente
e em cada ano se acrescentam mais histórias, mais testemunhos, mais lições de
vida, mais rostos… e assim também aumenta a minha vontade de poder regressar por
mais uma vez. Lá sinto-me bem, tão bem que já considero Chapadinha a minha
segunda casa. E todos aqueles que guardo em meu coração e na minha memória uma
segunda família.
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